EU D’OURO
EU DOR
EU D’OUTRO

No conjunto de poemas desta plaquete transparece uma implicância crítica com a
ideia de um “eu lírico” que possa existir ou ser usado como forma naturalizada de
expressão, vinda da náusea de seu uso acrítico, como mero sintoma: disseminam-se na
poesia contemporânea eus se doendo cegados pela fantasia de um brilho próprio,
como de ouro, motocontínuo, máquina que funciona por si própria infinitamente salva
da finitude. Assim, contra o ronronar desse mortor, os poemas desta plaquete, pelo
que está implicado nesse uso, são problematizadores e reflexivos ao colocarem em
suspenso a ideia de que haja um “eu” que pense se expressando, sugerindo, assim, que
“esse “eu, como um nome”, é “sempre falsa designação”. Nessa moedura da ideia, em
palimpsesto, sobrepõem-se incisões sobre acepções correntes como a ideia
rimbaudiana de que “eu é um outro”, fantasia-se um exemplo de biografia paradoxal
entre a vida e a morte como a do escritor argentino Roberto Arlt, ou recria-se um
diálogo professoral entre Oscar e Wilde e André Gide como exemplos, entre outros,
de indagações sobre esse reiteradamente dito como fantasioso “eu lírico”. E, não se
furtando, esse fantasma da plaquete expõe a vida de um sujeito que transita entre a
psicologia e a fisiologia tentando existir, senão na vida, num poema falacioso como
um lugar de falha.