Uma das críticas mais frequentes dirigidas aos jornalistas – e os da piauí não ficam de fora – é que gostam muito de notícia ruim. Pois, tentando driblar a crítica, a edição deste mês traz dois textos que, embora não se detenham em aspectos tão alentadores, só existem em função de duas boas notícias: a chegada da vacina ao Brasil e o fim da era Trump.

Sobre a chegada da vacina, Malu Gaspar conta como o presidente Jair Bolsonaro agiu, em público e nos bastidores, para boicotar a “vacina chinesa do Doria” (O sabotador). Sobre o fim da era Trump, o historiador Timothy Snyder, em texto originalmente publicado na NYT Magazine, reflete sobre o pré-fascismo do ex-presidente e o futuro da democracia norte-americana (O abismo americano). Em complemento factual ao artigo de Snyder, o jornalista colombiano Cristóbal Vásquez, que estava no Congresso no dia da invasão dos trumpistas, descreve a balbúrdia sem descuidar da ironia: um repórter latino-americano cobrindo uma tentativa de golpe nos Estados Unidos (A última Coca-Cola do Capitólio).

A edição traz também uma reportagem inesperada. João Batista Jr. reconstitui o acidente aéreo que matou metade dos passageiros e tripulantes no litoral da Bahia em novembro de 2019 e revela que alguns dos sobreviventes resolveram processar o dono do avião – um bilionário pouquíssimo conhecido (O dia em que eles caíram do céu).

Na série Arrabalde, agora em sua quarta parte, João Moreira Salles narra um caso didático: como a cidade de Paragominas, no interior do Pará, conseguiu se organizar para poupar suas florestas (A reviravolta). Também do Norte vem a fotografia do belenense Luiz Braga, que ao retratar uma garotinha da Ilha de Marajó, produziu uma comovente síntese da inocência e da esperança (Do quintal esquecido).

Temos, ainda, um artigo em que Roberto Andrés mostra como Bolsonaro levou para dentro do seu governo a lógica dos condomínios fechados que desumanizam nossas cidades (Vivendas do Alvorada). E Armando Antenore conta a curiosa história de um falso acaso (E.T. de Ipanema).

Em tributo às boas letras, a edição deste mês traz um artigo em que o norueguês Karl Ove Knausgård discorre sobre a relação entre escritores e editores (Até lá onde a narrativa não chega) e um trecho do livro Cartas a uma Negra: Narrativa Antilhana, da martinicana Françoise Ega, no qual a autora se dirige, com uma picardia toda própria, à brasileira Carolina Maria de Jesus, a qual nunca conheceu (Mas a senhora é negra). Para encerrar, apresentamos seis poemas cortantes extraídos da dicção inventiva da gaúcha Eliane Marques (Havia um poço).

Divirta-se e boa leitura!
André Petry
Diretor de redação

P.S.: The BolsozApp Herald, que fez sua estreia na revista em janeiro de 2019, acabou. Sim, uma parcela dos leitores certamente dirá que fechamos a carta com uma notícia ruim. Mas, em troca, estamos preparando uma novidade – das boas. Aguarde.