Se o incesto sempre existiu, até a título de exceção ritual em certas culturas antigas e tradicionais, para preservar a pureza das linhagens dinásticas, ele já há algum tempo vem voltando como fenômeno vergonhoso em nossas sociedades. No entanto, nada indica que sua freqüência seja maior que antes: mas a penalização crescente desse crime pela justiça periodicamente o coloca sob os faróis da atualidade. Para além da opinião, ele interpela não só o juiz, o psiquiatra, o psicoterapeuta, o educador, mas também aqueles que têm a experiência dessa violência, pais e filhos, e nós todos na medida em que a passagem ao ato do abusador e o silêncio da vítima tocam nosso inconsciente. Que não nos enganemos: o incesto consumado não é a realização de um desejo edipiano, ele aniquila essa fantasia, transformada em traumatismo.

Laure Razon empreendeu uma pesquisa original a partir de um número significativo de dossiês que comportavam queixas em delegacias, perícias dos pais, sobretudo do abusador, enfim confissões e declarações de uns e outros no tribunal. Por uma reflexão inspirada nas teorias psicanalíticas, ela extrai uma problemática paradoxal, específica da família incestuosa. Ao contrário das idéias preconcebidas, o abusador só raramente é um perverso, nem sempre alcoolista. Mais próximo de um “estado-limite”, derradeira muralha contra a psicose, ele impõe silêncio e cumplicidade forçada a suas vítimas e à sua companheira, da qual se apresenta como o salvador. A família incestuosa é o sintoma que liga as histórias individuais dos pais, os quais só conheceram abandonos, separações e rejeições na própria infância. Mas, sobretudo, o autor evidencia o papel fundamental da mãe idealizada que inspira a todos um amor fusional. Todo risco de separação dessa mãe imaginária leva ao ato, suscita uma angústia de morte, justificando as contradições da família: submissão, segredo, retratação das confissões...