O cão mentecapto, terceiro livro de Otávio Linhares, traz 16 contos que imprimem ritmo acelerado e causam constante tensão ao leitor. A narrativa, impregnada de gírias curitibanas, apresenta personagens que vivem em ambientes agressivos, seja no âmbito social ou escolar, e que são frutos de estruturas familiares falidas.

A morte, a brutalidade no trato entre as pessoas, as emoções embaralhadas, o envolvimento precoce com as drogas, o desconforto e a inadequação são passagens e características comuns em todas as vozes que, vez ou outra, utilizam-se do sarcasmo como mecanismo de leveza para encarar a dura realidade.

Outro ponto importante em O cão mentecapto é a presença do mesmo recurso utilizado nos livros anteriores, Pancrácio (2013) e O esculpidor de nuvens (2015) — ambos lançados pelo selo ENCRENCA – Literatura de Invenção: a pontuação escassa. Ela permite que cada cena seja extremamente dinâmica. As vírgulas ausentes deflagram pensamentos caóticos, quase sempre conturbados. E com isso, a falta transforma-se em urgência de viver intensamente. No mais, não existem caminhos abertos para zonas de conforto.

Para o jornalista e escritor Daniel Zanella, que assina a quarta do livro, “O cão mentecapto entrega um movimento próprio de literatura, uma espécie de retorno sem ilusões, quando o passado não tem escolha de edição. Nessa saída da casa comum da nostalgia, da saudade, da idealização, Linhares sai também do habitat natural da linguagem, montando um palíndromo de traumas, violências, excitações”.