Fazer arder a fogueira na qual a obra nasce, restaurar, não a origem, mas algo dela que já se faz diferença e anamorfose quando se manifesta, buscar na expressão do louco e em suas obras expressivas, não as cinzas de um passado esfriado, mas as brasas quentes que fizeram arder as imagens deste arquivo da loucura, agora transmutado em Imagens do Fora, eis a que nos conduz este livro. Ele se traduz, ainda, como uma nota de anos de pesquisa sobre centenas de milhares de papéis deixados por concentrados do Hospital Psiquiátrico São Pedro que frequentaram a Oficina de Criatividade oferecida pela instituição nos últimos 28 anos. Pode-se dizer que este livro torna-se como um cume erigido pelo esforço da paciência infinita de uma pequena multidão e concentra-se no gesto de abordar o arquivo histórico do ponto de vista das imagens, tratando-se de acrescentar que ponto de vista é aquilo que instaura algo a mais, agregando outra camada de realidade ao que existe de forma hesitante e mínima. O olhar para as obras do arquivo da loucura passa em meio a tudo isso e não se fixa em reduzir as imagens a uma acepção ou outra de loucura (verdade essencial revelada ou degradação patológica), possibilitando-nos, assim, fugir aos reducionismos estigmatizadores ou santificantes. São escritas que se fazem como rasgaduras da própria história da loucura.