Nesse livro, o imortal Carlos Nejar vem provar que, apesar de discutível em algumas posições, a Academia Brasileira de Letras continua sendo uma das principais fontes de criação artística do país. Porém, aqui o poeta não se pretende imortal: apresenta-se como vivo cantor de sua terra, sua gente e suas tradições. Sem desdenhar o experimento formal, este livro repõe a questão da poesia de densidade romântica, que privilegia a informação lírica e épica: as fontes telúricas e familiares, os amores, as viagens, os animais e os elementos da natureza, concentrados sobretudo na idéia de Deus.

A Espuma de Fogo não é um livro de poemas, mas um poema único, com cerca de três mil versos. Paradoxalmente, trata-se de uma sucessão de momentos iluminados que se ligam por uma espécie de justa-posição respiratória do ritmo. [...] A exemplo de outros grandes poetas de tradição expressiva no Brasil, Carlos Nejar, neste livro, confere alento e rara substância à formação de uma mitologia pessoal. Partindo do Rio Grande do Sul, que o acompanha obsessivamente como imagem poética, em meio a outras de origem européia, o poeta destina-se ao espaço mítico da totalidade transcendente, o que talvez justifique a grande aceitação que possui entre os leitores brasileiros e, mais recentemente, em Portugal, onde acaba de sair primorosa edição de seus poemas reunidos. [...] Originando-se nos subterrâneos do indivíduo, o texto orienta-se para as vastidões da plenitude divina, mediada pela experiência com os temas da palavra, da vida e da morte. Lento, portanto, o ritmo do livro, apesar do multifacetamento sensorial das imagens, que requerem do leitor a indispensável observação do princípio interativo das grandes experiências estéticas.